Por que a maioria dos autos de infração de trânsito deveriam ser anulados?

A ausência da especificação dos fatos que ensejaram a lavratura do auto de infração de trânsito viola manifestamente o direito ao contraditório e à ampla defesa(cerceamento de defesa).


É uma prática bastante comum dos agentes de trânsito, ao lavrar o auto de infração de trânsito, mencionar apenas o artigo do Código de Trânsito Brasileiro que foi violado pelo condutor, sem especificar os fatos que ensejaram a violação da norma jurídica.
No campo "descrição da infração" é comum encontrarmos a transcrição literal do texto legal, conforme o seguinte exemplo:
Inicialmente, cumpre ressaltar que essa prática da Autoridade de trânsito é ilegal, uma vez que o § 3º do artigo 280 do Código de trânsito brasileiro é taxativo ao imputar ao agente fiscalizador o dever de relatar o fato constatado no próprio auto de infração para que a autoridade de trânsito possa tomar conhecimento da situação ocorrida (sempre que não for possível a abordagem do veículo objeto do ato infracionário) para, desta forma, aplicar a penalidade correspondente. Vejamos o que diz o referido dispositivo legal:
Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:
I - tipificação da infração;
II - local, data e hora do cometimento da infração;
III - caracteres da placa de identificação do veículo, sua marca e espécie, e outros elementos julgados necessários à sua identificação;
§ 3º Não sendo possível a autuação em flagrante, o agente de trânsito relatará o fato à autoridade no próprio auto de infração, informando os dados a respeito do veículo, além dos constantes nos incisos I, II e III, para o procedimento previsto no artigo seguinte.
Assim, a autoridade de trânsito não deve se limitar tão somente a reproduzir o texto da lei, uma vez que tal conduta contribui para um manifesto cerceamento de defesa, ao suprimir os fatos que motivaram a lavratura do auto de infração.
Vejamos os seguintes exemplos:
"Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência"(Art. 165);
"Desobedecer às ordens emanadas da autoridade competente de trânsito ou de seus agentes"(art. 195);
"Transitar em marcha à ré, salvo na distância necessária a pequenas manobras e de forma a não causar riscos à segurança"(art. 194)
"Utilizar-se de veículo para demonstrar ou exibir manobra perigosa, mediante arrancada brusca, derrapagem ou frenagem com deslizamento ou arrastamento de pneus ( art. 175)
O caro leitor deve estar se questionando: qual foi o fato praticado pelo condutor? Ora, qual foram os sinais nítidos da influência de álcool que alterou o seu comportamento?( vide o art. 5º e o anexo II da Resolução 432 de 2013 do CONTRAN). Houve alguma conduta anormal (dirigir em zigue zague, pela calçada, na contramão etc.)?
Qual foi a ordem desobedecida, a distância percorrida em marcha ré, como ela causou riscos à segurança dos demais condutores e pedestres, qual foi a manobra perigosa praticada e em que circunstâncias ela foi realizada?
Notem que sem os relatos descrevendo o modo como a infração ocorreu, torna-se impossível realizar qualquer defesa prévia, pois como o notificado irá se defender se ele sequer conhece os fatos que ensejaram a sua responsabilização? Estaria a Constituição Federal legitimando um procedimento administrativo Kafkiano?
Ora, como pode administração pública pretender sancionar os condutores infratores, restringindo direitos e afetando diretamente o seu patrimônio, sem propiciar os meios adequados de garantir o contraditório e a ampla defesa?
Com o intuito de evitar esse tipo de conduta do agente responsável pela autuação, a Portaria 59/2007 do DENATRAN estabelece que a descrição da infração deva ser realizada de forma clara, bem como dever constar os desdobramentos da infração, de modo a compreender as circunstâncias e o contexto em que ocorreu a determinada autuação:
BLOCO 5 – TIPIFICAÇÃO DA INFRAÇÃO
CAMPO 2 – ‘DESDOBRAMENTO DO CÓDIGO DE INFRAÇÃO’ - campo para registrar os desdobramentos da infração.
CAMPO 3 – ‘DESCRIÇÃO DA INFRAÇÃO’ – campo para descrever de forma clara a infração cometida.
Os tipos de infração descritos acima são abertos,(“manobra perigosa”,""desobedecer as ordens","distância necessária","influência de álcool"etc.), ou seja, precisa de um procedimento administrativo que lhe molde com adequação suficiente para que o administrado tenha a oportunidade de realizar a sua defesa nos termos previstos na Constituição Brasileira e no Código de Trânsito Brasileiro.
Qualquer obstáculo ou omissão nos atos da Administração Pública que cerceiem a defesa de seus administrados devem ser anulados, conforme enunciado da súmula 473 do Supremo Tribunal Federal:
A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
Portanto, é dever da administração pública proceder de forma adequada e eficaz, atentando para o cumprimento dos princípios da legalidade, contraditório e ampla defesa e demais regras constitucionais e infraconstitucionais que regem o ordenamento jurídico brasileiro.

ÁREA PROMOCIONAL

PARTE DA LEI FEDERAL QUE REGULAMENTA O JORNALISTA NÃO FORMADO

4. ÂMBITO DE PROTEÇÃO DA LIBERDADE DE EXERCÍCIO PROFISSIONAL (ART.
5°, INCISO XIII, DA CONSTITUIÇÃO). IDENTIFICAÇÃO DAS RESTRIÇÕES E
CONFORMAÇÕES LEGAIS CONSTITUCIONALMENTE PERMITIDAS. RESERVA LEGAL
QUALIFICADA. PROPORCIONALIDADE. A Constituição de 1988, ao
assegurar a liberdade profissional (art. 5
o
, XIII), segue um
modelo de reserva legal qualificada presente nas Constituições
anteriores, as quais prescreviam à lei a definição das "condições
de capacidade" como condicionantes para o exercício profissional.
No âmbito do modelo de reserva legal qualificada presente na
formulação do art. 5
o
, XIII, da Constituição de 1988, paira uma
imanente questão constitucional quanto à razoabilidade e
proporcionalidade das leis restritivas, especificamente, das leis
que disciplinam as qualificações profissionais como condicionantes
do livre exercício das profissões. Jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal: Representação n.° 930, Redator p/ o acórdão
Ministro Rodrigues Alckmin, DJ, 2-9-1977. A reserva legal
estabelecida pelo art. 5
o
, XIII, não confere ao legislador o poder
de restringir o exercício da liberdade profissional a ponto de
atingir o seu próprio núcleo essencial.
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