Então, você teve uma ideia legal para um filme, um livro, um produto, uma máquina, ou uma nova forma de executar um serviço. Você acha que, se bem executada, a sua ideia pode fazer sucesso e te render um dinheiro interessante. Mas antes de começar, você quer proteger a sua ideia para se certificar de que ninguém irá roubá-la e executar antes de você, certo?
Em primeiro lugar, parabéns pela iniciativa. Seu modo de pensar é válido e está correto. Como criador, você deve levar suas criações a sério e agir da forma mais profissional possível.
Porém, você precisa estar ciente de que, se a sua ideia ainda não foi executada, protegê-la juridicamente é um pouquinho mais complicado.
E então você se pergunta: como vou registrar a minha ideia?
Antes de descobrir de fato como podemos proteger juridicamente a sua ideia, vamos esclarecer alguns pontos que você precisa saber.
1) Não existe registro ou patente de ideia, ou direitos autoraissobre ela
É natural que as pessoas usem os termos “registro”, “patente”, “direitos autorais” e outros, para se referir à proteção jurídica de alguma criação abstrata. Existe uma diferença formal entre registro, patente e direitos autorais (registros são para marcas, patentes são para invenções e modelos de utilidade que possam ser aplicadas na indústria, e os direitos autoraisprotegem criações intelectuais como os escritos, músicas, projetos de arquitetura etc).
Porém, o que você precisa saber é que nenhum desses conceitos se aplica às ideias.
Não há nenhum órgão oficial ou procedimento legal específico para catalogar ideias, projetos ou criações abstratas.
Isto porque...
2) Na verdade, não existe proteção jurídica para ideias
É isso mesmo, a legislação brasileira (e de vários outros países, embora eu não possa afirmar categoricamente que são todos) não considera que as ideias estejam sujeitas à proteção jurídica.
Mas isso não é um absurdo?
Na verdade, nem tanto. Pense da seguinte forma: proteger uma ideia seria como proteger um pensamento. A ideia, enquanto ainda não for realizada, nada é mais do que um pensamento. Você consegue imaginar que seja possível registrar um pensamento? Quantos pensamentos você já teve na vida? Como ter certeza de que você foi a primeira ou a única pessoa no mundo a ter um determinado pensamento?
Agora, juridicamente falando: as ideias não podem ser protegidas por lei porque não são sujeitos de direitos. Várias pessoas, seres, entidades ou objetos são sujeitos de direitos na legislação brasileira: pessoas (inclusive as que ainda estão sendo gestadas), animais, espólios, bens, marcas, empresas, entes políticos... Mas as ideias, não.
Isto porque ideias são coisas abstratas, elas pertencem ao campo da mente, o Direito não as alcança. É preciso a materialização de uma ideia para que ela venha se tornar uma res, uma coisa, um sujeito de direitos.
Então, o que eu faço?
1) Comece
Execute. Faça algo. Tire sua ideia do papel. Comece a colocá-la em prática. Do jeito que você puder.
Se a sua ideia se refere a um serviço ou produto, comece a montá-lo, ainda que não disponha de todos os recursos, estrutura ou tecnologia necessários.
Só poderemos começar a falar em proteger juridicamente a sua ideia quando ela deixar de ser apenas uma ideia, quando estiver impressa em algum meio ou quando já for digna de merecer proteção jurídica como produto ou obra.
Então, desenhe, faça protótipos, comece a testar de alguma forma. Se sua ideia está relacionada ao ato de empreender ou criar um negócio inovador, recomendo a leitura do livro “A Startup Enxuta”, de Eric Ries. Pesquise também sobre a técnica do bootstrapping.
Se a sua ideia é para um livro, um filme, uma série de TV ou uma música, seu primeiro passo é mais fácil ainda: escreva!
2) Guarde todas as anotações
Você se lembra do dia em que pensou na sua ideia pela primeira vez e a anotou no guardanapo do bar (foi assim que nasceu “Harry Potter”, aliás)? Guarde esse guardanapo (dica não jurídica: se estiver sujo de ketchup ou engordurado, dê um jeito de higienizá-lo... hehehehe).
Ou, se lembra de quando acordou no meio da noite com uma ideia incrível para uma música, pegou o celular, gravou um áudio com a melodia básica e voltou a dormir pra terminar quando amanhecesse? Não delete esse áudio!
Guarde tudo que esteja relacionado com a sua ideia: rascunhos, desenhos, anotações feitas em qualquer lugar, prints daquela conversa que você teve quando contou ao seu melhor amigo sobre a sua ideia, e-mails que mandou... Tudo. Peque pelo excesso. Sério mesmo.
Todos esses guardados vão ser muito úteis para fins de prova caso algum dia você precise defender a sua ideia em algum processo judicial ou qualquer outro problema ou disputa extrajudicial.
3) Seja cauteloso
Não saia expondo sua ideia em qualquer lugar ou revelando a qualquer pessoa.
Mesmo se surgirem oportunidades legais para receber feedback ou testar sua ideia, como congressos, feiras de investimentos, workshops, consultorias ou grupos de discussão, tome o cuidado de não revelar tudo. Tente expor um conceito genérico do que você pretende fazer. Lembre-se que a proteção jurídica está na execução, e a execução reside nos detalhes e no diferencial da sua ideia!
Se você pretende empreender, considere a hipótese de redigir um contrato de não-divulgação, para usar sempre que for falar com possíveis parceiros e investidores. Profissionais como advogados e contadores já são obrigados a manter confidencialidade sobre o que ouvem de seus clientes; mas ao expor suas ideias a outras pessoas, um acordo de não-divulgação pode ser interessante.
Encomendar um parecer técnico ou jurídico sobre a sua ideia pode ser uma boa estratégia também. Um profissional especializado na área da sua ideia pode dizer até que ponto ela é original e até que ponto pode ser protegida, além de fornecer outras recomendações. Você não fica obrigado a seguir esse parecer, mas ele pode servir como orientação, e você pode guardá-lo juntamente às outras coisas que explicamos no item anterior.
E, por fim...
4) Registre!
Ou patenteie, se for o caso.
Depois que a sua ideia deixar de ser uma mera criação da mente e já estiver entre nós, “habitando o mundo real”, aí sim você pode começar a pensar em pedir a patente da sua invenção, registrar a marca que criou para sua empresa, ou registrar sua obra de arte em algum lugar para facilitar a proteção e garantir os seus direitos de autor – isso mesmo, “facilitar”, pois teoricamente a obra de arte mesmo já é protegida por lei, mesmo sem registro.